quinta-feira, 7 de junho de 2012

DO CAOS O HOMEM CRIOU OS SEUS DEUSES (4)

Por Rafael Jácome



          Durante os diversos períodos da história da humanidade as religiões serviram como um instrumento de manutenção de poder, garantindo privilégios para a elite dominante. Foram parceiras nos processos econômicos, sociais, culturais, políticas e ideologias de opressão. Os deuses davam a garantia da manutenção da ordem social e através dos seus exemplos eram retiradas as premissas para a organização das comunidades. No mundo pagão da antiguidade o caos era sinal de poder, contanto que fossem obedecidas as suas regras e autoridades. Os deuses egípcios, gregos e romanos, expressavam todas as crenças e descrenças da humanidade, e, difundiram em grandes escalas a sua dicotomia. Na Roma antiga, onde o Estado romano era o empresário deles, nunca houve uma preocupação em resolver problemas entre os seus adeptos, aliás, além dos de casa, a cada conquista de outras regiões o número de deuses aumentava. No período republicano os romanos conviveram com uma multidão de deuses, onde se afirmava que existiam cidades com maior número de deuses do que a própria população. Os sacerdotes eram responsáveis pelo direito de regular as relações entre os homens, segundo a vontade dos deuses, que a comunicavam apenas a eles durante as cerimônias religiosas. Assim sendo, não sabiam com precisão quais eram seus direitos e deveres. Eram os sacerdotes que os comunicavam, caso por caso, constituindo-se desta forma como os primeiros advogados de Roma. Esta estrutura foi sucumbida muito tempo depois, após o surgimento do monoteísmo através do estoicismo e depois com o judaísmo e por fim, com o triunfo do cristianismo.
Hoje cada religião tem o seu culto e as suas crenças, que através dos seus dogmas fazem o homem acreditar nos seus absurdos, em coisas possíveis e contraditórias, conforme indica Voltaire: “injuriosas à divindade,... Não seria aquela que não sustentasse suas crenças com carrascos, e inundasse a terra com sangue por causa de sofismas ininteligíveis?”  Para muitos, as religiões durante séculos tem massacrado a sociedade com suas doutrinas, aonde as mais tradicionais chegam a afirmar que o homem deve-se moldar à idéia divina da humanidade para se tornar plenamente humano. Elas usaram os seus deuses para sufocar a criatividade humana, se fazem deles resposta geral para os problemas e contingências possíveis no seu senso de realização. Foi estabelecido o critério do ritual, onde as pessoas assistem os cultos sem se preocupar com as idéias, não aceitam mudanças e os rituais estabelecidos oferecem uma ligação com a tradição, a segurança e a garantia de que nada vai mudar. Os deuses são apresentados e impostos como a base do ser, amigos, apavorantes, o bem e o mal, essência da vida, humanitários, senhores da história, sobrevivência,...
“Essas fés primitivas exprimiam a perplexidade e o mistério que sempre parecem ter sido um componente essencial da experiência humana deste mundo belo mais aterrorizante. Como a arte, a religião foi uma tentativa de encontrar sentido e valor na vida, apesar do sofrimento que a carne herda. Como qualquer outra atividade humana, a religião pode sofrer abusos, mas isso parece ser o que sempre fizemos. Não foi imposta a uma natureza primordialmente secular por reis e sacerdotes manipuladores, mas era natural da humanidade. Na verdade, nosso secularismo atual é uma experiência inteiramente nova, sem precedentes na história humana. Ainda precisamos ver como vai funcionar. Também é verdade que nosso humanismo liberal ocidental não é uma coisa que nos vem naturalmente como a apreciação de arte ou poesia, tem de ser cultivado. O próprio humanismo é uma religião sem Deus – nem todas as religiões, claro, são teistas. Nosso ideal ético secular tem suas próprias disciplinas da mente e do coração, e oferece as pessoas os meios para encontrar o sentido último da vida humana, outrora proporcionados pelas religiões mais convencionais.”(Armstrong, Karen: Uma História de Deus, Companhia das Letras, 1994)

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